Sem Caixa, clubes lotearam espaço na camisa e viram receita cair

Dos 12 times patrocinados pelo banco estatal, sete conseguiram novos parceiros

Carlos Petrocilo | Folhapress

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Corinthians, 2012 - Foto: Lulciano Veronezi
Corinthians, 2012 - Foto: Lulciano Veronezi

Oito meses após a Caixa Econômica Federal não renovar o contrato com 12 dos 20 times da Série A do Brasileiro, 5 deles seguem sem patrocinadores. Dos que conseguiram novos acordos, a maioria aceitou valores menores do que era pago pelo banco estatal, que deixou de expor a marca no futebol numa decisão do governo Jair Bolsonaro (PSL).

Caixa disse, em nota que a “estratégia atual de marketing é voltada para projetos regionais, com maior impacto social e de incentivo ao desenvolvimento de atletas de base”.

Entre os clubes que ficaram sem a Caixa, cinco passaram a ter bancos privados como patrocinadores. Outros dois, Bahia e CSA, fecharam com empresas regionais. O clube alagoano conseguiu ainda um apoio do governo do estado.

Penúltimo colocado do Brasileiro, o time de Maceió é o único que diz ter aumentado a sua receita com patrocínio após a saída. A camisa da equipe passou a expor cinco marcas. Entre elas, a do governo do estado, que sozinho ofereceu R$ 1,5 milhão pelo espaço no uniforme do clube. O presidente do CSA, Rafael Tenório, é suplente do senadorRenan Calheiros (PMDB-AL), pai do governador do estado.

“A receita saltou para R$ 4 milhões, a Caixa nos pagava R$ 1,5 milhão. O governo e os dois máster [Carajás e Açaí Concept], juntos, me pagam R$ 3 milhões”, afirmou Tenório.

Com saída da Caixa, CSA expõe 5 marcas só na parte frontal da camisa.

Lanterna do Brasileiro, o Avaí vive realidade distinta. Segundo o presidente do clube, Francisco José Battistotti, o espaço mais nobre foi oferecido para empresas por metade do valor arrecadado em 2018. 

“A Caixa pagou R$ 4 milhões no ano passado, eu baixei pela metade, cheguei a pedir R$ 1,8 milhão, mas não encontrei interessados”, afirma o dirigente. 

Em 14 partidas no Brasileiro, o time catarinense conseguiu apenas seis pontos. Na outra ponta da tabela, a agonia é a mesma. Primeiro colocado, o Santos, com 32 pontos, se contentou com alguns acordos pontuais. Depois, cedeu o espaço, sem custos, para o Graacc, entidade social que auxilia crianças e jovens com câncer.

Procurada, a diretoria santista não quis comentar a ausência de um patrocínio principal.

O Bahia conseguiu, assim como CSA, um acordo com uma empresa local. O clube de maior torcida do estado assinou com a Dular, revendedora de alimentos, e recebe 65% do que era pago pela estatal —R$ 9,5 milhões, por ano. O contrato prevê um valor fixo ao clube e participação no lucro de alguns produtos.

“A diferença [na comparação com o valor pago em 2018], vamos resolver com outras duas novas propriedades na camisa”, disse Lênin Franco, gerente de negócios do Bahia.

A solução de lotear espaços no uniforme foi replicada por outros clubes, que chegam a expor até cinco marcas. “Aumentamos dois espaços menores na parte frontal, além do principal, e três nas costas”, diz o Lavor Neto, diretor de marketing do Ceará. “Tem muitos clubes explorando mais propriedades que a gente, mas isso não valoriza a marca e fica até confuso de identificá-la.”

Em julho, o clube cearense acertou com a FinanZero, que opera como correspondente bancário online e negocia empréstimos junto a instituições financeiras, válido até o final de agosto.

Para Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a exposição dos clubes é importante para que os bancos digitais alcancem os mais diversos públicos. “A camisa do time aparece diariamente em todas as mídias, atinge regiões onde instituições tradicionais têm agências físicas, redes para captar clientes e uma fintech ainda tenta alcançar aquele público”, disse Oliveira.

Athletico Paranaense, Cruzeiro e Fortaleza fecharam com o banco Renner, que estampa a marca do seu produto digital ‘Digi+’, enquanto o Flamengo passou a exibir a financeira BS2. O Atlético-MG retomou a parceira com o BMG.

Clube que tinha o maior contrato com a Caixa, o Flamengo não informa o valor do pago pelo novo patrocinador. “Estamos satisfeitos com os resultados”, disse Maurício Cortela, diretor de marketing da equipe. O clube recebia R$ 32,6 milhões por ano em 2018.

Nos acordos dos bancos com os clubes, as empresas ofereceram participação de lucros em produtos oferecidos, desde a abertura de uma conta a linhas de créditos. A ideia é usar a base de torcedores e de sócios para aumentar a carteira de clientes das financeiras. 

Ricardo Rotenberg, vice-presidente comercial e de marketing do Botafogo, afirma que foi procurado por 12 bancos digitais. O clube do Rio segue sem patrocínio principal.

“Tivemos propostas dessas empresas que tem contrato com cinco clubes, mas não aceitamos o modelo proposto”, disse o botafoguense. “Estamos buscando com paciência, sabemos que o momento no Brasil não é propício. Enquanto isso, aumentamos quatro espaços para anunciantes.”

“A Caixa pagava valores acima do mercado”, admite Marcelo Paz, presidente do Fortaleza. “A nossa previsão era de arrecadar R$ 4 milhões. Vamos atingir R$ 3 milhões”, diz.

Plínio Signorini Filho, CEO do Atlético-MG, acredita que, no longo prazo, poderá alcançar com o BMG um valor próximo ao que a estatal pagou ao clube em 2018 -R$ 13 milhões, incluindo premiações por conquistas do Brasileiro, Copa do Brasil, Libertadores ou Sul-Americano e Mundial.

“O modelo atual é ganha-ganha. O clube e a empresa montaram um banco juntos, o BMG Galo, assim como foi feito no Corinthians”, diz o dirigente. 

BMG é um velho conhecido do clube mineiro. Ricardo Guimarães, principal acionista da instituição, presidiu o Atlético-MG entre 2001 e 2006. No Brasileiro de 2011, o banco estava na camisa de 11 times.

José Colagrossi, diretor do Ibope Repucom, vê com cautela as parcerias com os bancos digitais.

“Os clubes entregam grande exposição de marca aos bancos, o que gera um valor de mídia enorme, entretanto, sem qualquer garantia que as metas de receita serão atingidas”, diz Colagrossi. “Num cenário muito pessimista, é possível que ao final do contrato o clube tenha entregue mais de 1 bilhão de reais em valor de mídia sem receita proporcional.”

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