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TSE facilita caminho para futuro partido de Bolsonaro, onde metade da cúpula é investigada

Flávio e Jair Bolsonaro no lançamento do Aliança pelo Brasil.EVARISTO SA / AFP

Flávio e Jair Bolsonaro no lançamento do Aliança pelo Brasil.EVARISTO SA / AFP

Tribunal Superior Eleitoral decidiu nesta terça-feira que assinaturas eletrônicas podem ser usadas para formalizar a criação de partidos políticos no Brasil. A decisão apertada, por 4 votos a 3, não definiu quando a nova regra começará e se estará disponível antes das eleições muncipais de 2020. Ainda assim, o desfecho benefecia o Aliança pelo Brasil, partido que Jair Bolsonaro pretende fundar. Os partidários do presidente planejam apresentar registros biométricos via aplicativo para acelerar o processo para a obtenção das quase 500.000 assinaturas necessárias para o trâmite. Hoje, tudo tem que ser feito em papel, calhamaços entregues fisicamente nos cartórios eleitorais.

O julgamento é anterior à ideia de Bolsonaro de criar sua própria sigla de extrema direita. Foi motivado por uma consulta apresentada no ano passado pelo deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS), que fez a petição ainda no ano passado. Luis Roberto Barroso, que será presidente do TSE no ano que vem, votou a favor da inovação, mas a condicionou ao desenvolvimento tecnológico das autoridades eleitorais. “Vai que a gente não consegue desenvolver essa ferramenta?”, ponderou.

Cúpula do Aliança investigada

Enquanto vê a via mais livre rumo à criação do Aliança, os aspirantes a formar o novo partido se esforçam para coordenar discurso e prática. Mesmo com a defesa da intolerância com a criminalidade e combate à corrupção, ao menos três dos seis membros da cúpula da comissão provisória do têm investigações criminais em aberto. São eles: o senador e 1º vice-presidente, Flávio Bolsonaro, o suplente de senador e 2º vice-presidente, Luís Felipe Belmonte, e o secretário-geral e advogado eleitoral do presidente, Admar Gonzaga Neto. O senador é investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro pelos delitos de lavagem de dinheiro, malversação de fundos públicos e organização criminosa. Belmonte foi citado em uma investigação de corrupção ativa em Rondônia. Gonzaga é réu pelo crime de lesão corporal mediante violência doméstica contra sua ex-mulher, no Distrito Federal.

Dessas três investigações, apenas a do secretário-geral foi concluída e aguarda a data do julgamento na primeira instância. Em 2017, quando era ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a então mulher de Gonzaga, Élida Souza Matos, registrou um boletim de ocorrência contra ele por agressão. Segundo seu relato, o advogado atirou um pote de enxaguante bucal em seu rosto durante uma discussão. A teria chamado de “prostituta, vagabunda e escrota”, dizendo ainda que ela não serviria nem para “pano de chão”. A Procuradoria-Geral da República o enquadrou na lei Maria da Penha. Gonzaga nega a agressão, diz que Élida escorregou e bateu o rosto na banheira.

O caso de Flávio Bolsonaro é o mais emblemático por se tratar de um filho do presidente e pelos reflexos em outros processos. Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal retomou o julgamento de um recurso que paralisou 935 inquéritos policiais pelo uso de dados fornecidos pelo antigo Conselho de Controle da Atividade Financeira (COAF), atual Unidade de Inteligência Financeira (UIF). A ação afetou uma investigação contra o filho do presidente, que se refere à suspeita de que servidores do gabinete do então deputado estadual devolveriam parte de seus salários a ele por intermédio de seu assessor à época Fabrício Queiroz. É o esquema conhecido no meio político como “rachadinha”. Flávio se viu envolvido no caso Queiroz após o Coaf apontar movimentações suspeitas de mais de 1 milhão de reais em sua conta.

Seja como for, o Ministério Público do Rio de Janeiro já havia informado que, desde setembro, há aberta uma segunda apuração contra o senador aberta. Dessa vez, ele é suspeito de empregar “funcionários fantasmas”. E, segundo uma nota dos promotores, não houve qualquer apuração com o uso de dados da UIF, por isso estaria tramitando normalmente, sem qualquer impedimento. “O presente inquérito tem objeto diferente e independente, não tendo como origem qualquer relatório financeiro de inteligência”.

Os defensores do parlamentar negam a coleta dos salários dos servidores, assim como a contratação de fantasmas. Em nota, o advogado Frederick Wassef afirmou que “todas as pessoas que foram nomeadas, na época, eram qualificadas para as funções que exerciam”. E completa o defensor: “Ao final de todo o processo ficará comprovado que não houve qualquer ilegalidade”.

Já o 2º vice-presidente do Aliança pelo Brasil, Luís Felipe Belmonte, foi acusado em 2017 pelo Ministério Público Federal sob suspeita de ter pago propina a um ex-desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região, o que ele nega com veemência. “Se alguém quiser te acusar que você recebeu dinheiro para escrever uma matéria, pode. Mas tem de provar isso. É o que o Ministério Público fez comigo, acusou, mas não consegue provar porque não há nada de errado”, afirmou.

O processo do Ministério Público Federal aponta que, em 2010, em uma ação trabalhista, um sindicato de trabalhadores em educação que tinha sido representado pelo escritório de advocacia de Belmonte conseguiu receber o pagamento de 107 milhões de reais em precatórios da União. Seu escritório ficou com 11 milhões de reais desse valor. A decisão foi dada pelo então desembargador Vulmar de Araújo Júnior. Segundo a investigação, um ano e meio depois, o advogado teria usado um laranja para comprar um imóvel que pertencia ao desembargador pelo preço de 1,2 milhão de reais. A Procuradoria diz que a casa valeria 400.000 reais. O valor a mais seria a propina pela liberação dos precatórios, na avaliação dos procuradores. “O Ministério Público não tem nenhum laudo para embasar essa afirmação. Já a Polícia Federal diz que a área construída do imóvel, além dos 900 metros quadrados do terreno em volta dele valeria pelo menos 1,150 milhão. Ou seja, onde está esse sobrepreço?”, questiona Belmonte.

Punição no PSL

Nessa terça-feira, a Executiva Nacional do PSL anunciou punições contra 18 deputados federais que devem seguir Bolsonaro para o seu novo partido. Os que tiveram a maior pena, de um ano de suspensão das atividades partidária são: o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, Daniel Silveira, que ficou conhecido por quebrar uma placa de rua com o nome da vereadora Marielle Franco, Bibo Nunes e Alê Silva, ambos ativistas que têm feito as principais críticas contra o comando do PSL. Os outros 14 parlamentares tiveram punições que variavam de advertência até a dez meses de suspensão. Quando um parlamentar está suspenso, é natural que ele seja afastado de qualquer cargo diretivo da legenda, lideranças partidárias, assim como de comissões parlamentares. Ou seja, Eduardo Bolsonaro deve perder o cargo de líder do PSL na Câmara, um posto que provocou racha no partido.

Oficialmente, os parlamentares reclamam da punição e alguns dizem que vão recorrer. É o caso, por exemplo, de Carlos Jordy, suspenso por sete meses: “Isso é uma perseguição contra pessoas que são leais ao Presidente e aos seus eleitores”. Nos bastidores, porém, o revés pode ter um lado positivo. Os parlamentares podem alegar na Justiça Eleitoral que estão sendo perseguidos e deixar a legenda rumo ao Aliança sem serem cassados.

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