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STF proíbe privatização de estatais sem aval do Congresso, mas permite venda de subsidiárias

Plenário do STF concluiu nesta quinta (6) julgamento que analisou se o governo pode vender estatais sem autorização do parlamento — Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (6) que o governo federal não pode vender estatais sem aval do Congresso Nacional e sem licitação quando a transação implicar perda de controle acionário.

Na terceira sessão de julgamento do tema, a maioria dos magistrados da Suprema Corte permitiu vendas sem autorização do parlamento somente para as empresas estatais subsidiárias. A decisão também vale para governos estaduais e prefeituras.

Uma empresa subsidiária é uma espécie de subdivisão de uma companhia, encarregada de tarefas específicas no mesmo ramo de atividades da “empresa-mãe”. A Petrobras, por exemplo, tem 36 subsidiárias, como a Transpetro e a BR Distribuidora; a Eletrobras, 30; e o Banco do Brasil, 16.

O governo federal tem, segundo o Ministério da Economia, 134 estatais, das quais 88 são subsidiárias.

Para o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, a decisão foi “importantíssima” para os investimentos previstos no setor de petróleo e gás e no setor elétrico. “Vai permitir, também, para a nossa política de abertura do mercado de derivados e do gás, gerar competitividade e justeza tarifária, fundamental para a retomada do crescimento econômico e industrial do país”, acrescentou.

Ao final do julgamento, a maioria dos ministros foi a favor do que o governo Jair Bolsonaro pretendia: a flexibilização de regras para a comercialização de estatais.

Para a corrente majoritária, a flexibilização não fere a Constituição e pode favorecer o crescimento econômico.

Ao tomar a decisão, o plenário do STF derrubou em parte uma decisão liminar (provisória) concedida no ano passado pelo ministro Ricardo Lewandowski, que havia proibido o governo de vender estatais sem autorização do Congresso.

Lewandowski proibiu a venda ao analisar uma ação apresentada pela Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf).

O plenário do STF começou a julgar o tema na semana passada. Nesta quarta (5), quando o julgamento foi retomado, Lewandowski foi o primeiro a votar e manteve o mesmo entendimento que o fez conceder a liminar no ano passado. O julgamento foi interrompido na quarta-feira quando o placar estava empatado em 2 a 2.

Nesta quinta (6), o Supremo voltou a analisar o assunto, e o plenário se dividiu entre duas diferentes correntes de voto:

  • Ricardo Lewandowski e Edson Fachin votaram para exigir aval do Legislativo na venda de qualquer empresa pública;
  • Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Dias Toffoli decidiram autorizar a venda de subsidiárias sem aval do Congresso. Com exceção de Cármen Lúcia e Marco Aurélio, o restante dos magistrados desta corrente de voto entendeu que não é necessária licitação para fazer esse tipo de operação.

Interesse de R$ 80 bilhões

Apesar de o Supremo ter divulgado a pauta de todo o semestre no fim do ano passado, a ação foi incluída na pauta de julgamentos somente em maio para solucionar impasses de interesse do governo federal em relação a venda de ativos e privatizações.

O governo federal alega que poderia gerar mais de R$ 80 bilhões de caixa com privatizações. Nas últimas semanas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o advogado-geral da União, André Mendonça, fizeram um périplo por gabinetes de ministros do Supremo para defender a possibilidade de o Executivo poder se desfazer de empresas estatais sem aval do Legislativo.

Ao final do julgamento, o advogado-geral da União afirmou que a eventual venda de estatais consideradas “empresas-mãe” vai obedecer o entendimento do Supremo, que passou a exigir aval do Congresso Nacional e licitação.

“Foi definido que a venda das matrizes depende de lei e isso é do jogo democrático, e o STF deu essa segurança jurídica para que, em relação às matrizes, nós sigamos ritos específicos e certamente o Poder Executivo vai seguir aquilo que foi estabelecido pelo STF.”

Ao mesmo tempo que demonstrou resignação com a decisão do Supremo em relação às “empresas-mãe”, André Menonça celebrou a possibilidade de a União se desfazer das subsidiárias sem controle legislativo. Para ele, a liberação da venda das subsidiárias sem amarras vai permitir a eficiência no poder público.

“A grande questão é que aquilo que representava um exagero de empresas públicas, estatais, essas subsidiárias, criadas sem lei, elas também agora podem ser vendidas independentemente de uma lei específica. E agora seguindo um parâmetro é o parâmetro dos princípios da Constituição. Da eficiência, da moralidade, da competitividade, da isonomia entre os participantes. E isso é o que vinha sendo feito e o que continuará sendo feito”, complementou o chefe da Advocacia-Geral da União.

Como votaram os ministros

  • Ricardo Lewandowski: ao apresentar o voto na quarta-feira, o relator da ação manteve o entendimento que o levou a conceder liminar suspendendo a venda de estatais sem aval do Legislativo. Para ele, “crescentes desestatizações” podem trazer prejuízos ao país. Lewandowski disse que é necessária autorização por meio da aprovação de lei para a venda das empresas públicas sempre que houver perda do controle acionário. O magistrado destacou ainda que o Estado não pode “abrir mão” da exploração de determinada atividade econômica sem a necessária participação do Congresso.
  • Alexandre de Moraes: o ministro divergiu do relator, abrindo a corrente que entendeu que o aval do Congresso só é necessário quando se tratar de “empresa-mãe”. “Entendo que o Estado possa vender todas as suas ações de uma determinada subsidiária. Está nas regras do mercado privado. Me parece que a única limitação é perder o controle acionário da empresa-mãe. Aí estamos falando de privatização”. Na visão do magistrado, se não tiver instrumentos de gestão empresarial idênticos aos do mercado, a estatal não é competitiva.
  • Edson Fachin: o magistrado ressaltou que, na interpretação dele, a Constituição exige lei para a venda de estatais. “Esta é a escolha que fez o constituinte originário”, enfatizou. Fachin destacou ainda que, para ele, o pedido de dispensa de licitação feito ao Supremo “extrapolou os limites da lei”, “pois dispensou, sem lei específica, a transferência de ativos sem necessário procedimento de licitação”.
  • Luís Roberto Barroso: se posicionou a favor de permitir a venda de estatais sem aval do Congresso ou licitação. “A Constituição não tratou deste assunto”, ponderou. Na visão dele, “raramente uma Corte constitucional deve interferir” na ordem econômica. “Para desinvestir, não vale a mesma regra que vale para criar”, observou o ministro. “Não é preciso lei e muito menos lei específica.”
  • Cármen Lúcia: em seu voto, a ministra afirmou que não é necessária autorização legislativa para alienação de subsidiárias. “Não me parece que para essas operações seja necessária a autorização legislativa expressa”, ponderou. A ministra também defendeu a lei de licitações e ressalvou que o problema não é a legislação, e sim quem não a cumpre. “A lei de licitação cria uma série de entraves e dificulta a vida, mas veio dar uma resposta.”
  • Rosa Weber: a magistrada defendeu a necessidade de aprovação de uma lei genérica para autorizar a venda de estatais. “Não se exige lei específica para cada caso de criação de subsidiária, desde que haja autorização legislativa genérica”. Rosa argumentou ainda que há exceções em relação à obrigatoriedade de licitação, mas sempre baseadas em lei.
  • Luiz Fux: o ministro também votou para permitir a venda das estatais sem aval do Congresso. “Eficiente é o sistema que propicia flexibilização das estatais e alienação de subsidiárias que vêm causando prejuízos”, defendeu. Segundo Fux, essas operações vão trazer aos cofres públicos dinheiro “essencial”. O magistrado defendeu que a venda de estatais ocorra sem licitação, com base no princípio da eficiência, para “atração de investidores”.
  • Gilmar Mendes: o magistrado defendeu que não é expressa na Constituição a necessidade de aval do Congresso para processos de desestatização. “Se é compatível com a Constituição a possibilidade de criação de subsidiárias, não há como obstar a alienação de empresa subsidiária, ainda que a medida envolva a perda de controle acionário do Estado”. “É dispensável a autorização legislativa específica para a alienação quando houver previsão na própria lei que instituiu a empresa estatal matriz”, acrescentou.
  • Marco Aurélio Mello: defendeu que não há necessidade de autorização legislativa para a venda de subsidiárias. O ministro argumentou que nenhum parlamento tem interesse na extinção de sociedades de economia mista e subsidiárias. “Ao contrário, se pudesse, criaria até mais”, afirmou. Ele ponderou que a licitação é necessária e votou para manter a liminar concedida no ano passado neste sentido.
  • Celso de Mello: para o decano da Corte, quando o estado intervém como agente econômico, não há necessidade de lei específica para alienar subsidiárias. “Apenas quando a lei que autoriza a constituição da entidade matriz, da empresa estatal, é omissa. No mais, incide a jurisprudência, que se satisfaz com a autorização genérica”, enfatizou. “Não há necessidade de qualquer autorização legislativa, inclusive, no tocante ao poder acionário”. Segundo Celso de Mello, há uma exceção na própria Constituição que dispensa licitação no caso de subsidiárias.
  • Dias Toffoli: o presidente da Corte acompanhou o entendimento que defendeu a venda de estatais sem autorização do Congresso. “Para a subsidiária, eu entendo que não é necessário”. Toffoli disse que é desnecessária a licitação nesses casos.

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