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Potiguar que mora em Wuhan, epicentro do coronavírus, conta mudanças na rotina após cidade ser ‘fechada’

Rodrigo e a namorada aproveitam tempo de isolamento para cozinhar, assistir filmes e jogar videogames — Foto: Arquivo pessoal

Rodrigo e a namorada aproveitam tempo de isolamento para cozinhar, assistir filmes e jogar videogames — Foto: Arquivo pessoal

Em meio ao surto do coronavírus, o potiguar Rodrigo Duarte, de 28 anos, que mora em Wuhan, na China, local apontado como epicentro do vírus, ainda lida com a dúvida de como a infecção se espalha e com a incerteza de quando a rotina da cidade vai voltar ao normal. Sem ter entrado em contato com a embaixada brasileira, Duarte disse que só volta ao Brasil caso a representação brasileira no país elabore um plano de extração que não coloque os brasileiros em risco de contaminação.

Há quatro anos na cidade, ele é um dos cerca de 60 brasileiros que vivem no local. Lá, abriu uma academia de judô e contou que decidiu suspender as aulas no dia 18 de janeiro em virtude do aumento do número de infecções registradas na cidade.

Para ele, mesmo com as informações emitidas pelo governo chinês, ainda não há clareza na forma de transmissão do vírus. Ele relatou que existem casos de pessoas que não apresentam sintomas e, mesmo assim, contaminam outras pessoas. “Não existe clareza, pelo menos para mim, de como esse vírus pode ser transmitido”, contou.

Ele contou que o governo chinês emite cartas oficiais que determinam medidas de segurança e divulgam dados atualizados de pessoas infectadas, casos suspeitos, mortos e curados país, em cada província e também nas cidades. Segundo o brasileiro, o governo local dá orientações sobre saúde, alimentação e cuidados. “Pelo que entendo ainda estamos aprendendo a lidar com o vírus, então estamos seguindo as orientações”, relatou.

Segundo Rodrigo, a Suécia retirou quatro cidadãos da cidade. O professor relatou que países como EUA e França, que registravam cerca de 100 cidadãos na China cada, já retiraram grande parte destas pessoas. “A ação mostra qual a prioridade de cada país. Contra fatos não existem argumentos”, reclamou.

Rodrigo relatou que os brasileiros que estão na cidade se comunicam por um aplicativo de mensagens instantâneas. Um deles faz o contato direto com um representante da embaixada brasileira que tem ouvido, coletado informações e tranquilizado os brasileiros isolados na cidade, segundo o potiguar.

Mesmo assim, Rodrigo criticou atuação do governo do Brasil. “A posição de nosso ministro e nosso presidente são lastimáveis. Qual a função e para quem é o estado?”, disse.

Ele disse que não procurou a embaixada pessoalmente e só pensa em sair da China caso haja um plano de extração que não os coloque em risco de contaminação. “Caso o plano não seja satisfatório e eu sinta que existe risco, prefiro ficar aqui. Estou bem em casa, confortável e não está faltando nada”, adiantou.

O G1 entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores para questionar como é feito o contato com brasileiros que estão China e se há um plano de extração de quem está em Wuhan e em outras cidades do país asiático, mas não houve retorno até o fechamento desta matéria.

Mudança na rotina

Rodrigo vive sozinho mas está em casa com a namorada, que é chinesa. Segundo o brasileiro, ela ficou na casa dele já que há uma restrição do uso de veículos na cidade, o que impossibilita que consigam dirigir até a casa dela. Duarte disse que eles aproveitam o tempo de isolamento para cozinhar, jogar videogame, assistir filmes e também para aprender um dialeto local. “Está sendo divertido”, comentou.

O período em que o coronavírus mudou a rotina do país coincide com as comemorações do ano novo chinês, que segundo Rodrigo neste ano foi de 23 a 29 de janeiro. “Os chineses se reúnem com a família. Parece com o nosso Natal, mas prolongado”.

Segundo Rodrigo, o plano original seria as atividades voltarem nesta quinta-feira (30), mas ainda não há expectativa para isso. “É uma semana onde as pessoas ficam em casa com a família. Não mudou muito a diferença desse ano em relação aos anos passados”, disse.

Isolado desde o dia 18 de janeiro, o brasileiro precisou ir ao supermercado três vezes; a última nesta terça-feira (28). Ele relata que, com a exceção de vegetais, encontra tudo o que precisa com facilidade. “A maioria abre às 9h ou 10h e fecha às 17h ou 18h. Às vezes os supermercados lotam”, contou.

Duarte também relatou que no sábado (25), antes da restrição do uso de carros, pegou o veículo dele e procurou um supermercado maior, mas não conseguiu entrar no local. “Tinha muito carro, não deu para entrar”, disse. Desde então, passou a ir fazer compras a pé, em um mercado próximo de casa.

O professor de judô, que esteve pela última em Natal foi em 2016, antes de se mudar para a China, mantém contato constante com a família e amigos. “Eles estão preocupados. Mas estou tranquilizando eles com dados oficiais que mostram a realidade. O governo está sendo responsável ao tentar solucionar o problema. O isolamento é importante para que o vírus não se multiplique”, contou.

Ele disse que a segurança, a valorização do professor e a cultura foram fatores determinantes para que ele escolhesse se mudar para o país asiático. “Não tenho medo de andar nas ruas com meu celular. Eu me sinto seguro e protegido. Em segundo o fator econômico para minha profissão. Professor é respeitado e bem pago”, disse.

Casos suspeitos no Brasil

O Ministério da Saúde brasileiro afirmou nesta terça-feira (28) que investiga os três primeiros casos de suspeita de coronavírus no Brasil. Um deles envolve uma estudante de 22 anos de Minas Gerais que esteve em Wuhan e apresenta sintomas compatíveis com os provocados pelo novo vírus.

Os outros dois casos suspeitos, em Porto Alegre e em Curitiba, também se enquadram nos critérios epidemiológicos (os pacientes estiveram na região onde o vírus é transmitido de pessoa para pessoa ou tiveram contato com pessoas suspeitas ou confirmadas de terem o vírus nos últimos 14 dias) e clínicos (apresentaram febre e pelo menos um sinal ou sintoma respiratório), estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para identificação de possíveis infecções.

Segundo o ministério, desde o início do surto houve “mais de 7 mil rumores” no Brasil de pacientes que teriam o vírus, informou a pasta.

Se houver alguma confirmação, será o primeiro caso do novo coronavírus tanto no Brasil quanto na América do Sul.

‘Perigo iminente’

O Ministério da Saúde elevou a classificação de risco do Brasil para o nível 2, que significa “perigo iminente” – até segunda-feira (27) o país estava em nível 1 de alerta. A mudança de patamar faz parte de um protocolo envolvendo a escala, que vai de 1 a 3 – o nível mais elevado só é ativado quando são confirmados casos transmitidos em solo nacional.

  • Nivel 1- alerta
  • Nível 2 – perigo iminente
  • Nível 3 – emergência em saúde publica

O Ministério diz ter recebido, desde o início do surto de coronavírus na China, “mais de 7 mil rumores” de infecção, segundo Mandetta. Desse total, 127 exigiram verificação do órgão e apenas um se confirmou como suspeita.

O ministro da Saúde afirmou que o governo federal “está preparado” para detectar o vírus. “Não é um sistema que está sendo preparado agora. Temos o plano de contingência e o que vamos fazer é atualizar.”

Mandetta destacou que a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a classificar como “elevado” o risco internacional de contaminação pelo novo coronavírus – antes, considerado “moderado”. Segundo o ministro, com o novo status, o Brasil amplia o monitoramento dos casos. Ele explica que antes, o governo monitorava pessoas que passaram pela província de Wuhan, onde estão concentrados os casos na China.

“Agora, nós vamos [considerar suspeitas] em toda a China, não importa em qual província. E vale de hoje para frente. Muito provavelmente, vai haver uma sensação de que estamos aumentando os casos suspeitos” – ministro da Saúde

Casos de coronavírus pelo mundo – 29/01 9H — Foto: Juliane Monteiro/ G1

Estatísticas

Nesta quarta-feira (29), as autoridades de saúde anunciaram mais 26 mortes, o que eleva o balanço do coronavírus a 132 vítimas fatais, e 5.974 casos confirmados na China continental (sem contar Hong Kong, Macau e Taiwan).

A cifra já supera o número de infecções da epidemia de Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars) de 2002 e 2003, outro coronavírus que contaminou 5.327 pessoas no país. A Sars deixou 774 mortos no mundo, 349 deles na China continental.

Além da China, outros 15 países nos quatro continentes já registraram casos confirmados de infecção por coronavírus. A epidemia já atingiu mais de 6 mil pessoas e deixou mais de 130 mortos.

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