Bolsonaro conversa com cinco partidos para sair do PSL, diz advogada

Karina Kufa avisa que pretende judicializar o pedido de auditoria no partido caso Bivar não disponibilize dados

Naira Trindade e Bela Megale | O Globo

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Advogada eleitoral do presidente Jair Bolsonaro, Karina Kufa14/10/2019 Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo
Advogada eleitoral do presidente Jair Bolsonaro, Karina Kufa14/10/2019 Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

BRASÍLIA — Em meio à crise travada com o PSL, a advogada eleitoral de Jair Bolsonaro, Karina Kufa, admite que o presidente tem intensificado conversas com dirigentes de pelo menos cinco partidos antevendo uma eventual desfiliação ao PSL. Em entrevista ao GLOBO, Karina avisa que pretende judicializar o pedido de auditoria caso o presidente nacional do PSL, Luciano Bivar, não disponibilize dados das prestações de contas do partido e diz que a legenda teme “abrir a caixa preta do Bivar”.

Quais as chances de conciliação entre o presidente Jair Bolsonaro e o PSL?

Depende muito dos interesses do grupo do presidente da República, senador Flávio e demais deputados que estão nessa ala de buscar transparência do partido e de saber para onde estão indo os recursos públicos, porque ninguém tem conhecimento e nunca foi feito uma análise de contas detalhadas desse exercício. Em anos anteriores, o tribunal já apontou a ausência de documentos obrigatórios. A implementação de compliance é nada mais que a utilização de instrumentos de gestão administrativa e financeira do partido.

Mas hoje existe a possibilidade de um acordo?

O presidente está analisando o cenário e verificando com cautela um ambiente partidário que não vá respingar em qualquer escândalo,  em irregularidades que prejudiquem o próprio governo. O interesse dele jamais foi dirigir o partido, ele já dirige o país. O interesse dele é que o partido ande de forma harmônica e que tenha de fato essa garantia e segurança de que nenhuma corrupção ocorra no ambiente partidário.

Uma eventual reconciliação passaria pela saída de Bivar do comando do PSL?

Esses acordos políticos dependem deles. Os advogados só agem em nome do cliente, não o contrário.

O que aconteceu para deixar a relação entre Bolsonaro e PSL tão acirrada?

Já tem muitos meses que se busca uma conciliação. Tudo desencadeou porque logo que veio o resultado das eleições, o presidente soube pela imprensa dos escândalos das candidaturas laranjas. Não se tem uma conclusão do que ocorreu mesmo, mas escândalos partidários trouxeram desgastes ao governo.  Além disso, teve uma matéria em que mencionava o uso de notas frias do gabinete do presidente do partido e também diversas denúncias pelo Brasil todo de irregularidades e desvios na indicação de diretórios. Isso passou a preocupar o presidente. Também foi prometida a troca de líderes e a aplicação de compliance. Mas mesmo tendo uma proposta séria, com uma empresa de renome, conceituada, eles acabaram decidindo não assinar o contrato.

E a que você associa essa resistência deles? .

É exatamente o que está acontecendo agora, um medo de uma auditoria e um medo de abrir a caixa preta do Bivar.

O que são essas acusações do presidente Bivar de que “querem fazer coisas não éticas” com recursos do partido?

Essas acusações são levianas, maldosas e refletem muito provavelmente ao que fez no partido nos últimos anos. É um absurdo achar que as empresas de implementação de compliance possam ter interesses escusos. Essa alegação é leviana e absurda.

A cúpula do PSL diz que os advogados querem emplacar no partido contratos de prestação de serviços milionários com publicidade, assessoria de imprensa, escritórios advocatícios e compliance…

É devaneio deles. Essas indicações eram sugestões de bons prestadores de serviços. Qualquer filiado pode fazer essas indicações, mas eles vetam todas e decidem entre os dois. Teve uma contratação grande de uma agência de publicidade e os filiados ficaram sabendo depois. Não teve possibilidade de indicar ou fazer pesquisa de preço. O único trabalho que foi feito buscando o menor preço foi em relação ao compliance e acredito eu que era para ganhar tempo. A gente perdeu um mês fazendo diversas reuniões com empresas. Acho que o interesse era não cumprir o acordo e sim ganhar tempo para chegar próximo à eleição municipal e não ter opção para a ala bolsonarista trabalhar e se empenhar nas eleições municipais. Não restou alternativa senão fazer pedido de auditoria para saber exatamente o que está acontecendo dentro do partido.

Chegou até seu conhecimento essa apuração sobre o Eduardo e o CPAC?

Eu sou advogada do Eduardo. Esse evento foi realizado pela Fundação, cujo presidente é filho do Bivar. Então, ele que deveria prestar esclarecimento. O Eduardo só deu a ideia do evento.

O Bivar mantém três filhos na Executiva, isso incomoda o presidente?

Há um incômodo. Os parlamentares reclamam muito. Eles dizem de de 70% a 80% do diretório é formado por parentes ou pessoas próximas e até com vínculo de subordinação ao Bivar e ao Rueda (Antonio Rueda é vice presidente do PSL). E isso incomoda muito os parlamentares porque jamais teremos dentro do PSL uma eleição equilibrada por conta dos votos de cabresto.

Qual será a estratégia se o PSL não abrir as contas em no prazo?

Vamos pedir judicialmente. Não tem como negar a entrega do material, até porque o próprio Estatuto do PSL prevê o acesso aos documentos e às contas.

O PSL sinalizou que pode liberar os deputados em troca de manter na legenda o fundo partidário. O presidente está disposto a fazer um acordo deste tipo?

O presidente e os 20 parlamentares que assinaram a carta falam expressamente que não fazem questão do fundo partidário, até porque foram eleitos sem dinheiro público. Mas temos que ponderar que não seria razoável, diante de tantas denúncias de irregularidade, permitir que um partido que sempre foi administrado de uma forma coronelista e individual venha a ficar com mais de R$ 8 milhões por mês para gastar como bem entende. Esses recursos não devem ficar nas mãos de quem tem demonstrado interesse em fazer mau uso do dinheiro público. É unânime que esse só não quer que o recurso fique no PSL para ser mal administrado por ser dinheiro público. Não podemos aceitar desvios.

A possibilidade desse grupo e do presidente Jair Bolsonaro abrir mão do fundo para sair do partido existe?

Eles abririam mão se houvesse uma possibilidade do dinheiro ir para a União, mas não para ficar no PSL. É dinheiro público, já temos indícios de má gestão, não tem como esse dinheiro ficar no partido. Mas também não fazem questão de levar. Se for para a União, está ótimo.

Hoje, qual a chance do presidente Bolsonaro deixar o PSL?

Vai depender da decisão política do presidente. Lá atrás, o presidente estava desgostoso com o partido e fiz um pedido para que tentasse a conciliação. Foi quando eu conversei com o vice-presidente da sigla, Rueda, para negociar um acordo.

E se não der certo um acordo?

Não podemos adiantar estratégia jurídica. Mas nossa ideia é ter um partido que contemple todos os princípios e pautas que elegeram Jair Bolsonaro e os parlamentares que o seguiram. Na campanha viemos com um discurso de ética, mas a gente vê que o partido tem que estar na mesma linha. Se caminhar para mudarmos de partido, vamos escolher uma legenda que esteja alinhada com os princípios éticos e morais da bancada e do presidente  e que a gente construa uma nova forma de partido político, com a aplicação de compliance desde o primeiro dia, com trabalhos constantes de formação política, inclusive voltado para as mulheres. E será assinado um termo de boas práticas partidárias com o Ministério Público Eleitoral.

Com quais partidos estão conversando?

Bastante. Partidos em formação tem uns cinco atrás da gente, de médio para grande vieram dois e pequenos teriam mais três opções. 

Tem prazo para essa definição?

Se o presidente definir que não é possível fazer um acordo com o PSL, o próximo passo é fechar com um desses que nos procuraram logo após a declaração do presidente (sobre Luciano Bivar). Antes, não havia negociação em andamento. 

Nem com o Patriota?

O Patriota é um cliente meu. Hoje (ontem) foi o primeiro dia que o Adílson (Barroso, presidente do Patriota) entrou em contato comigo para falar sobre o assunto. Ele nunca tratou sobre isso comigo antes. 

Então é uma opção que está em avaliação?

Só não são partidos em formação porque, segundo levantamento que fizemos, o único partido que tem condições de obter o registro hoje é de extrema esquerda e não temos como abrir o diálogo.

Por mais que o presidente e deputados dizem não fazer questão de dinheiro do fundo, há custos para uma reeleição. Esse dinheiro não é importante?

Da mesma forma que ele conseguiu arrecadar R$ 4 milhões e fazer a campanha sem dinheiro, vai conseguir a mesma coisa. Não há preocupação com isso.

Qual a posição dos filhos do presidente sobre a conciliação?

Flávio e Eduardo vão seguir a diretriz do pai. Ambos assinaram o pedido de auditoria nas contas do PSL.

Como ficará a situação dos deputados ameaçados de expulsão?

Eles estão alinhados com Bolsonaro independentemente da consequência. Alguns relataram que estão sofrendo pressão para apoiar Bivar, inclusive já perderam comissões. O grupo vai tomar decisões conjuntas sempre seguindo o presidente, isso foi definido pelos parlamentares. Se forem para o partido, todos irão juntos.   

Há uma aproximação com o Podemos?

Não, eles estão procurando os parlamentares individualmente.

Por que o presidente falou para o apoiador ‘esquecer o PSL’?

Foi uma espontaneidade dele, talvez demonstrando insatisfação com os escândalos do partido.

A senhora se sentiu diretamente atacada pelo presidente do PSL?

Não, porque todas as declarações direcionadas a mim e ao Admar Gonzaga (ex-ministro do TSE, que também atua na defesa de Bolsonaro) são tão levianas e esdrúxulas que não levei em consideração.

Não avalia que Admar Gonzaga deveria ter cumprido uma quarentena, já que ele foi ministro do TSE e relator das contas da campanha de Bolsonaro no ano passado?

Não existe, pela legislação, uma quarentena. Os ex-ministros do TSE avaliam suas quarentenas seguindo seus próprios critérios. Acho que é um critério pessoal de Admar e ele não cometeu nenhuma ilegalidade.

Não é incoerente o Admar pedir prestação de contas de um partido que ele aprovou no TSE como ministro? 

A Justiça Eleitoral já declarou diversas vezes que não tem condições de se aprofundar na auditoria das contas. Então, essa é uma auditoria feita de forma superficial. Nada impede que seja feita uma nova auditoria, e por isso a necessidade contratar uma empresa renomada, para ir a fundo em cada gasto realizado, para identificar se houve irregularidade. Se houve irregularidade, isso pode ser encaminhado para a Justiça Eleitoral, para Receita e também para o Ministério Público para fins de responsabilização por improbidade administrativa. 

Se o presidente está preocupado com a transparência, por que não afasta o ministro do Turismo que já foi denunciado pelo Ministério Público? 

Não tenho autonomia para falar a respeito dessas questões envolvendo ministérios. Essa é uma decisão que cabe ao presidente. Também não tenho conhecimento dos autos para avaliar se há concretude nos delitos atribuídos a ministro. Fico impossibilidade de dar minha opinião.

O que motivou a senhora a ficar no PSL por todo esse tempo?

Somente implementar as regras de compliance para que o partido fosse um lugar seguro para o presidente. Se não fosse pelo presidente eu jamais teria interesse em me manter no partido como advogada. No partido, convivo com muitas atitudes machistas.

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