Lula e a manifestação do MPF favorável à saída dele da cadeia: “Não alimento expectativa para não ter frustração”. Por Joaquim de Carvalho

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Depois de cumprimentar a todos, Lula se ajeita na cadeira, coloca uma pasta sobre a mesa e diz: “Vocês perguntem o que vocês quiserem”.

Com paletó preto e blusa branca de gola rolê, Lula fala do frio em Curitiba. Brincaria mais tarde que estava elegante. Antes de começar, Lula coloca uma pastilha na boca, gesto que se repetiria ao longo das duas horas e cinco minutos de entrevista — ele teve câncer na garganta.

Uma das primeiras perguntas foi sobre o impeachment de Bolsonaro. Ele é contra, embora considere o governo dele um desastre.

“O governo é essa desgraceira que é, mas não adianta a gente ficar se lamentando. A gente tem que brigar, brigar no Congresso Nacional, brigar no movimento sindical, brigar nas universidades. O que estão fazendo nas universidades é simplesmente jogar fora tudo que nós construímos, tudo. E foi muita coisa que nós construímos”, afirmou.

Insisto: Não seria o caso de impeachment?

Lula diz que o PT não pode fazer com Bolsonaro o que Aécio fez com Dilma Rousseff. Se houver crime de responsabilidade, que se investigue e depois disso, aí sim, se proponha o impeachment.

O ex-presidente lembrou que Bolsonaro foi eleito pelas regras do jogo que o PT aceitou.

Mas o processo foi viciado, já que ele não pôde participar.

Ao responder, Lula compara a situação à de um jogo de futebol. Se um time entra em campo, quando termina a partida e o adversário vence, o resultado não pode ser contestado.

Lula afirmou que o PT deve transformar o programa apresentado por Fernando Haddad na campanha eleitoral em projetos de lei, para indicar caminho para a retomada do crescimento. Também defendeu o fortalecimento das campanhas de rua e o apoio à greve geral marcada para dia 14.

Perguntei a Lula: O senhor acha que agora, com esta manifestação do Ministério Público, o senhor vai sair daqui?

Explica-se: Em manifestação ao Superior Tribunal de Justiça, a Procuradoria Geral da República se disse favorável à progressão de regime para Lula, o que significa que ele poderia ir para o semi-aberto, em que trabalharia de dia, e passaria a noite em estabelecimento penal próprio.

No caso dele, por ter sido comandante supremo das Forças Armadas, não existiria esse estabelecimento adequado para o regime semi-aberto, e Lula poderia cumprir pena em casa.

O ex-presidente respondeu: “Eu não sei (se vou sair). Deixa eu contar uma coisa para vocês. Eu não gosto de alimentar expectativa. Não tem nada pior para um preso do que expectativa frustrada. Quando você está livre, você marca o encontro com uma namorada ou namorado, e ele não comparece, você fica fulo da vida, vai num bar, toma uma cachaça ou um uísque e você fica normal. Mas, quando você está preso e tem uma expectativa e ela não acontece…

Lula, de qualquer forma, não aceitaria usar tornozeleira eletrônica. De maneira incisiva, disse: “tornozeleira é para bandido ou pombo correio”.

Se não alimenta expectativa de deixar a prisão, já sabe o que fazer quando isso ocorrer: vai se casar.

A namorada é Rosângela Silva, a Janja, por quem ele usa aliança de compromisso na mão direita.

Lula também falou que não quer que ninguém sofra por estar com ele, e lembrou o sofrimento dos filhos, alvo de campanha de difamação na rede social.

Lula ainda falou dos estudantes, dos artistas, dos movimentos sociais, do Brasil, da imprensa e de seu maior compromisso, o compromisso com o povo brasileiro.

“A pessoa que eu escolhi tem que saber que eu não troco esse compromisso que eu tenho com o povo por nada, sobretudo esse povo que está aí (Vigília) há um ano e dois meses, todo santo dia, com frio ou com calor. Sinceramente, eu não mereço isso.”

Antes do término da entrevista, falou sobre o pacto entre os poderes da república, costurado por Bolsonaro. Sem citar nome, criticou o presidente do STF, Dias Toffoli.

“Quando você faz uma reunião e aparece o presidente da Suprema Corte e a informação que a gente recebe é pacto é por conta das reformas, não é crível, não é crível, como falariam alguns amigos porque, se alguém da sociedade brasileira quiser entrar com um recurso contra a reforma, vai entrar na Suprema Corte. E como é que pode? Um cara que é presidente vai se sentir impedido ou não? Ele vai poder votar ou não? Então, as pessoas precisam se preservar.”

A íntegra da entrevista concedida por Lula ao DCM e ao site Tutameia será publicada na noite de hoje.

A entrevista foi realizada depois de quase um ano de luta nos tribunais travada pela advogada Tânia Mandarino, em nome do DCM. A certa altura, Lula falou da importância a mídia independente.

“É a minha fonte de informação”.


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